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Porto Velho, Rondônia - O policial militar Fabio Anderson Pereira de Almeida, envolvido na morte do jovem negro Guilherme Dias Santos Ferreira, de 26 anos, em São Paulo, foi reprovado em um exame psicológico da Polícia Científica do Paraná em 2023. A informação consta em documentos obtidos pelo g1 e reacende o debate sobre os critérios de seleção e acompanhamento emocional de agentes da segurança pública.
O caso aconteceu na noite de 4 de julho de 2025, na zona sul da capital paulista. Guilherme, que era marceneiro e voltava do trabalho, foi atingido por um disparo na cabeça. O PM, que estava de folga, alegou em boletim de ocorrência que confundiu o rapaz com um assaltante. O crime ocorreu cerca de sete minutos após a vítima bater o ponto de saída da fábrica onde trabalhava.
Reprovação em avaliação psicológica
Em 2023, Almeida concorreu ao cargo de Agente Auxiliar de Perícia Oficial da Polícia Científica do Paraná. Durante o processo, foi considerado inapto na fase de avaliação psicológica, após apresentar desempenho abaixo dos parâmetros exigidos em três dos dez critérios avaliados. Entre eles, segundo o relatório, estavam agressividade controlada, equilíbrio emocional e trabalho em equipe, este último com classificação "muito baixa".
Embora o resultado não implicasse a existência de transtornos mentais, a banca avaliadora concluiu que o candidato não possuía os requisitos psicológicos necessários ao exercício da função pública em questão. Almeida recorreu da decisão por via administrativa e, posteriormente, judicial, alegando “vícios insanáveis” no processo. No entanto, o recurso foi negado pelo juiz Diego Santos Teixeira, do Juizado Especial da Fazenda Pública.
As circunstâncias do crime
Guilherme Ferreira foi morto enquanto corria para pegar o ônibus de volta para casa. O policial alegou que havia sido abordado por dois suspeitos armados em uma tentativa de assalto. Em meio à confusão, disparou sua arma, atingindo o jovem. O boletim de ocorrência registrou o crime como homicídio culposo — quando não há intenção de matar — e o PM foi preso em flagrante, mas liberado após pagamento de fiança. Ele foi afastado das funções operacionais.
Segundo familiares, Guilherme estava no segundo dia de trabalho após retornar de férias. Em sua mochila havia uma marmita, talheres, um livro e o uniforme da empresa. Testemunhas confirmaram que ele saiu da fábrica às 22h28. O crime aconteceu por volta das 22h35, na Estrada Ecoturística de Parelheiros, região onde fazia diariamente o mesmo trajeto.
A esposa da vítima, que recebeu a última mensagem do marido às 22h38, disse que estranhou o atraso e só soube da morte após procurar notícias nas redes sociais. “Ele nunca chegava tarde sem avisar. Quando vi as mensagens, meu mundo desabou. Ele foi morto pelas costas, só porque era um jovem negro correndo”, declarou emocionada.
Investigação e posicionamentos
A Polícia Militar de São Paulo declarou que o caso será apurado com rigor. O coronel Emerson Massera, chefe de comunicação da corporação, classificou o disparo como “erro de avaliação”. “Na tensão da ocorrência, o policial cometeu um erro que, infelizmente, resultou na morte de um rapaz”, disse.
Massera também afirmou que o PM iniciou a ocorrência como vítima de uma tentativa de roubo, mas que a corporação analisará as circunstâncias para garantir justiça. “Nosso compromisso é apurar com isenção e responsabilidade”, acrescentou.
A Secretaria de Segurança Pública de São Paulo e a defesa do policial foram procuradas pela reportagem, mas não se manifestaram até a publicação da matéria. A Polícia Científica do Paraná também optou por não comentar o caso, alegando que o processo segue sob trâmite judicial.
Debate sobre preparo psicológico
A revelação de que o autor do disparo já havia sido considerado inapto em avaliação psicológica anterior levanta preocupações sobre os critérios adotados na formação e acompanhamento dos policiais no Brasil. Especialistas afirmam que falhas no controle emocional de agentes armados representam risco à população e ao próprio servidor público.
O caso reacende o debate sobre o racismo estrutural nas abordagens policiais. A viúva de Guilherme afirma que o marido foi morto por ser negro e estar correndo. “Se fosse outra pessoa, branca, bem vestida, nada teria acontecido. Ele foi executado por um estereótipo, não por um crime que nunca cometeu”, declarou.
A morte de Guilherme Ferreira se junta a outros casos que colocam em xeque os protocolos de uso da força e de atuação de policiais fora de serviço. Organizações de direitos humanos cobram celeridade nas investigações e punição adequada, além de políticas públicas de segurança que priorizem o controle emocional e o preparo ético dos profissionais.
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