Levantamento do Inmet mostra que outras 98 localidades estão há mais de dois meses sem ver uma gota d'água

Usina São Martinho, em Pradópolis: cidade, que não tem registro de chuva há 142 dias, é polo produtivo de cana-de-açúcar — Foto: Reprodução/São Martinho

Porto Velho, Rondônia -
Temperaturas que beiram os 40 graus, baixa umidade relativa do ar, sol escaldante, queimadas e nenhuma previsão de chuva. Esse é o cenário que os moradores de Pradópolis, na Região Metropolitana de Ribeirão Preto (SP), enfrentam há quase cinco meses. No pequeno município, de 21 mil habitantes, não chove há 142 dias. A marca recorde colocou a cidade no topo de um levantamento realizado pelo Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet), a pedido do GLOBO, sobre as cidades mais secas do Brasil em 2024.

O estudo, que leva em consideração dados monitorados até esta quarta-feira (21), aponta outras 69 localidades em longos períodos de estiagem, ultrapassando intervalos de cem dias sem chuva. Destaque para os estados de Minas Gerais, que lidera a tabela com 25 cidades, e Goiás, que surge na sequência com 16.

Dentre as capitais, quatro aparecem na lista: Cuiabá (125 dias), Belo Horizonte (124 dias), Brasília (120 dias) e Goiânia (118 dias). Há ainda 98 municípios que somam dois meses sem precipitações. Outros 132 estão há pelo menos um mês sem ver uma gota d'água.

O impacto da seca nesses lugares é grande. Em Pradópolis, onde o céu permanece limpo desde 31 de março, não há perspectiva de melhora. Nascido e criado na cidade, Jhonnata dos Santos, de 33 anos, atesta que "o clima na região é naturalmente quente". Apesar de estar acostumado com o calor, o advogado e enfermeiro diz que nunca vivenciou um período de seca tão extenso como o de agora.

— Esse ano me surpreendeu. Estamos no inverno e as temperaturas estão próximas a 40 graus. Além disso, a economia daqui gira em torno da cultura canavieira. É época da safra de cana-de-açúcar, então, há aumento de poeira no ar por conta da colheita nos canaviais. Isso agrava a situação, em especial os índices de doenças respiratórias. Digo por mim, que tenho rinite. Sofro bastante. Na terça-feira, passei por atendimento médico para tratar a alergia — conta o pradopolense.

Outro fator que causa preocupação aos moradores são as queimadas, mais frequentes em momentos de estiagem.

— É uma cidade pequena, cercada por zonas rurais em toda a extensão. Sem a chuva, a vegetação fica seca e há muitos incêndios em canaviais. São queimadas que duram várias horas até serem controladas, o que reduz ainda mais a qualidade do ar que respiramos. O meu avô já passou mal. Foi identificado em processo de desidratação de tão quente que fica aqui — lamenta Jhonnata.

Os efeitos de tanto tempo sem chuva são sentidos não só na saúde e no bem-estar da população, mas também no bolso. Desde que a seca teve início, afirma o advogado, a conta de energia elétrica sofreu um aumento de pelo menos 10% todos os meses.

— As temperaturas estão tão elevadas que o ventilador sopra ar quente, não é suficiente para amenizar o calor. Na minha casa, usamos umidificador de ar quase 24 horas por dia — detalha. — Não há muito o que fazer. A saída é banho gelado e beber o dobro de água. Dependendo do dia, deixo o carro ligado na garagem e fico dentro dele para usar o ar-condicionado e me refrescar um pouco — complementa.

Não é só em Pradópolis que a conta de luz ficou mais cara. Em Belo Horizonte, a Companhia Energética de Minas Gerais (Cemig) registrou aumento no consumo entre os meses de abril a julho, em relação ao mesmo período do ano anterior. O pico do crescimento se deu em julho, quando houve variação de 11,8% a mais em toda a cidade. Os números mostram ainda que, ao segregar a consumação apenas pelas residências, junho foi o mês com o maior avanço percentual: 10,1%.

Variações do consumo em relação ao mesmo período de 2023

MêsVariação totalVariação residencial
Abril8,3%2,0%
Maio5,0%6,1%
Junho11,6%10,1%
Julho11,8%8,5%
Fonte: Companhia Energética de Minas Gerais (Cemig)
Em Brasília, no Distrito Federal, a Companhia de Saneamento Ambiental (Caesb) informou que em períodos de seca, como o que a cidade enfrenta, há um aumento entre 7% e 10% no consumo de água por pessoa diariamente. Em média, um cidadão brasiliense consome 140 litros por dia. Em estiagem prolongadas, essa cifra pode chegar a 154 litros.

Andrea Ramos, meteorologista do Inmet, explica que a conjuntura climática é coerente. De acordo com a pesquisadora, além de estarmos no inverno, as localidades afetadas pela estiagem, especialmente as que estão na parte central do país, têm sofrido atuação de anticiclones.

— Tratam-se de municípios das regiões Centro-Oeste e parte do Sudeste do país, e cidades do oeste de Bahia, Piauí, Tocantins e Rondônia. Há muito tempo que, nesses lugares, há uma massa de ar seco e quente em baixos níveis, o que caracteriza os bloqueios atmosféricos que estamos vivendo. São anticiclones, em alta pressão, que têm como característica inibir a formação de níveis de chuva.

As cidades do Brasil há mais de cem dias sem chuva
  • Pradópolis (SP) — 142 dias
  • Pompéu (MG) — 140 dias
  • Montalvânia (MG) — 139 dias
  • Montes Claros (MG) — 137 dias
  • São Romão (MG) — 137 dias
  • Januária (MG) — 137 dias
  • Araguaçu (TO) — 135 dias
  • Pires do Rio (GO) — 133 dias
  • Mocambinho (MG) — 133 dias
  • Dores Do Indaiá (MG) — 131 dias
  • Cristalina (GO) — 130 dias
  • Águas Emendadas (DF) — 130 dias
  • Paranoá (DF) — 130 dias
  • Unaí (MG) — 130 dias
  • Espinosa (MG) — 130 dias
  • Uberaba (MG) — 130 dias
  • Paracatu (MG) — 130 dias
  • Brazlândia (DF) — 129 dias
  • Nova Maringá (MT) — 128 dias
  • Mineiros (GO) — 127 dias
  • Nova Porteirinha (MG) — 127 dias
  • Alto Paraíso de Goiás (GO) — 126 dias
  • Buritis (MG) — 126 dias
  • Cassilândia (MS) — 126 dias
  • Jataí (GO) — 125 dias
  • Edéia (GO) — 125 dias
  • Cuiabá (MT) — 125 dias
  • Morrinhos (GO) — 124 dias
  • Caiapônia (GO) — 124 dias
  • Catalão (GO) — 124 dias
  • Mateiros (TO) — 124 dias
  • Gama (DF) — 124 dias
  • Ouro Branco (MG) — 124 dias
  • Belo Horizonte (MG) — 124 dias
  • Patrocínio (MG) — 124 dias
  • Florestal (MG) — 124 dias
  • Patos de Minas (MG) — 124 dias
  • Sete Lagoas (MG) — 124 dias
  • Gilbués (PI) — 123 dias
  • Uberlândia (MG) — 123 dias
  • Goiás (GO) — 122 dias
  • Itapaci (GO) — 122 dias
  • Água Boa (MT) — 122 dias
  • Alto Araguaia (MT) — 122 dias
  • Sorriso (MT) — 121 dias
  • Querência (MT) — 121 dias
  • Brasília (DF) — 120 dias
  • Conceição das Alagoas (MG) — 120 dias
  • Ibirité (MG) — 120 dias
  • Goiânia (GO) — 118 dias
  • Barra (BA) — 118 dias
  • Chapada Gaúcha (MG) — 118 dias
  • Cacoal (RO) — 118 dias
  • Paranã (TO) — 117 dias
  • Tangará da Serra (MT) — 117 dias
  • São Miguel do Araguaia (GO) — 116 dias
  • Formoso do Araguaia (TO) — 116 dias
  • Irecê (BA) — 116 dias
  • Ibotirama (BA) — 116 dias
  • Gurupi (TO) — 115 dias
  • Porangatu (GO) — 114 dias
  • Luiz Eduardo Magalhães (BA) — 114 dias
  • Goianésia (GO) — 113 dias
  • Sinop (MT) — 113 dias
  • Almas (TO) — 106 dias
  • Pirapora (MG) — 106 dias
  • João Pinheiro (MG) — 106 dias
  • Santa Rosa do Tocantins (TO) — 105 dias
  • Monte Alegre de Goiás (GO) — 101 dias
  • Juína (MT) — 100 dias

Fonte: O GLOBO