Candidato a vice na chapa democrata à Presidência dos EUA, Tim Walz, durante discurso na Convenção Nacional Democrata — Foto: KAMIL KRZACZYNSKI / AFP
— Obrigado por me convidarem para essa campanha incrível — declarou Walz, emocionado com os milhares de cartazes com a expressão "técnico Walz", exibidos pelos presentes na Convenção. — É a honra de minha vida aceitar a indicação para vice-presidente dos Estados Unidos.
Para ele, essa será uma campanha sobre "liberdade", palavra que os democratas tentam associar à sua campanha, e que esteve presente em outros discursos desde a segunda-feira em Chicago.
— Quando nós, democratas, falamos sobre liberdade, queremos dizer a liberdade de fazer uma vida melhor para você e para as pessoas que você ama. Liberdade para tomar suas próprias decisões sobre saúde. Liberdade para seus filhos irem à escola sem se preocupar em serem mortos a tiros no corredor. — afirmou.
Ao exaltar Kamala Harris, que discursará nesta quinta-feira, pontuou as propostas da democrata para elevar a renda da classe média, que combinam benefícios fiscais e cortes nos preços de itens básicos, incluindo medicamentos, e dos aluguéis, responsáveis por grande parte dos gastos dos americanos.
— Não importa quem você seja, Kamala Harris vai se levantar e lutar pela sua liberdade de viver a vida que você quer levar. Porque é isso que queremos para nós mesmos e é o que queremos para nossos vizinhos — disse Walz. — Se você é uma família de classe média ou uma família tentando entrar para a classe média, Kamala Harris vai cortar seus impostos.
Candidato a vice na chapa democrata à Presidência dos EUA, Tim Walz, durante discurso na Convenção Nacional Democrata — Foto: Mandel NGAN / AFP
Walz louvou seu passado na Guarda Nacional, à qual se juntou aos 17 anos, e sua origem, do interior do Nebraska, celebrando o esforço de seus pais e seu trabalho como professor de escola pública e técnico de futebol americano em Minnesota. Algo que disse ter sido crucial para entrar na política.
— Foram esses jogadores e meus alunos que me inspiraram a concorrer ao Congresso — disse, recordando sua primeira campanha à Câmara, em 2006, quando obteve uma vitória surpreendente. — Viram em mim o que eu esperava levar a eles: um comprometimento com o bem comum, um entendimento de que estamos todos juntos nisso. E a crença de que uma única pessoa pode fazer uma diferença real para seus vizinhos.
Enquanto ele falava, a campanha de Kamala publicou no X um vídeo com uma ligação da vice-presidente a Walz, na qual pedia que "aproveitasse o momento" no palco em Chicago. Ela acompanhou o discurso em um hotel da cidade.
Antes do discurso, foi exibido um vídeo com depoimentos de estudantes e ex-colegas falando sobre o ex-professor Tim Walz. Ele foi apresentado ao público da Convenção por um desses estudantes, Benjamin Ingman, ao lado de atletas treinados pelo hoje candidato democrata a vice-presidente.
— Tim Walz é o tipo de cara com quem você pode contar para te tirar do banco de neve. Eu sei disso porque Tim Walz me tirou de um banco de neve — apontou Ingman.
Gwen Walz, sua mulher, também narrou sua história em vídeo, afirmando que ele "ensinou os estudantes a acreditarem neles mesmos", e que os inspirava e "mudava vidas". Em outra homenagem, o cantor John Legend e a cantora Sheila E. tocaram a canção "Let's Go Crazy", do astro do rock Prince, um dos artistas favoritos de Tim Walz — e natural de Minnesota — e de Kamala Harris.
Dentro das chapas republicana e democrata à Presidência dos EUA, Walz é quem tem a maior “rodagem” dentro da política americana. Eleito deputado em 2006, um ano depois de deixar a Guarda Nacional, e governador em 2018, o democrata também é conhecido por ter visões políticas mais alinhadas à ala progressista do partido.
— Enquanto outros estados estavam banindo livros de nossas escolas, estávamos banindo a fome de nossas escolas — declarou Walz no discurso, citando uma lei, aprovada em seu governo, que ampliava o acesso a jovens em vulnerabilidade social a refeições gratuitas nas escolas.
Glen Walz (E), mulher de Tim Walz, Gus Walz, filho de Tim Walz, e Hope Walz, filha do candidato democrata a vice-presidente dos EUA — Foto: KAMIL KRZACZYNSKI / AFP
Ele é ferrenho defensor dos direitos reprodutivos das mulheres, a começar pelo acesso a tratamentos de fertilização — sua filha Hope, “Esperança” em português, nasceu depois de um tratamento do tipo, algo que o governador faz questão de ressaltar em seus discursos, inclusive no desta quarta-feira. No atual ciclo eleitoral, em meio a ameaças às técnicas de fertilização in vitro vindas do campo republicano, ele tem usado o argumento como mais um ponto de ataque.
— Estou contando a vocês como começamos uma família porque isso é uma grande parte do que esta eleição significa — declarou o candidato democrata a vice-presidente. — Se você nunca passou pelo inferno que é a infertilidade, eu lhe garanto que você conhece alguém que passou.
Quando governador, Walz assinou medidas para proteger mulheres de outros estados que viajassem a Minnesota para realizar um aborto e para proteger o acesso à interrupção de gestações seu estado, depois da decisão da Suprema Corte, de 2022, que derrubou o direito legal ao aborto. Assim como Kamala, defende a aprovação de uma lei para restaurar o direito ao procedimento em nível nacional — após a decisão da Suprema Corte, cada estado ficou responsável por definir as regras, e alguns adotaram um veto quase total.
Sobre a questão ambiental, se apresenta como um "campeão" do clima, aprovando uma lei que obriga o estado de Minnesota a usar apenas fontes limpas de energia até 2040, além de incentivar o uso de veículos elétricos, também uma plataforma do plano de transição verde de Joe Biden, e destinar verbas a planos de adequação climática: em junho, o estado enfrentou algumas das maiores enchentes de sua história recente.
Um tema que levanta algumas sobrancelhas, inclusive entre independentes, é a questão das armas. Walz defende a aplicação da Segunda Emenda à Constituição, que trata do direito de ter armamentos no país, e se diz um caçador e dono de alguns equipamentos. Mas o político que no passado chegou a ser classificado como um dos favoritos da Associação Nacional do Rifle (NRA), o principal lobby armamentista dos EUA, hoje é favorável a controles de armas pesadas, como as usadas em massacres em escolas, shows e lugares de convivência em geral no país.
Em uma publicação no X, em julho, ele afirmou que era um político "nota A" para da NRA, mas que recentemente "so tirou F", a classificação mais baixa possível, e que estava bem com isso.
— Eu acredito na Segunda Emenda [da Constituição, que trata do direito às armas], mas também acredito que nossa primeira responsabilidade é manter nossas crianças seguras — disse Walz em Chicago.
Candidato a vice na chapa democrata à Presidência dos EUA, Tim Walz, na Convenção Nacional Democrata — Foto: SAUL LOEB / AFP
Mais do que políticas que possam agradar setores do Partido Democrata que se viram alienados nos últimos anos, Walz, ao lado de Kamala, simboliza uma metamorfose aguardada há algum tempo na sigla. Esta será a primeira eleição em décadas em que nenhum nome democrata “tradicional” — incluindo o próprio Joe Biden, que esteve nas urnas desde os anos 1970 — estará em disputas cruciais, e a troca na chapa presidencial, mesmo da maneira como ocorreu, energizou os apoiadores e sinalizou reais chances de vitória em novembro.
Neste contexto, Walz, um ex-professor que tem a retórica como um atributo conhecido, pareceu servir como uma luva na estratégia democrata. Mesmo antes de ser confirmado como vice de Kamala, ele chamou Trump e seus aliados de “esquisitos”, cravando um dos primeiros memes políticos da campanha. As menções à sua origem — ele nasceu em Nebraska e se elegeu por uma área rural de Minnesota — o levam para junto do chamado “americano médio”, o que o vice republicano, J.D. Vance, também tenta fazer, e podem quebrar algumas barreiras, como nos estados decisivos do Meio-Oeste.
Fonte: O GLOBO
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