Investigação apura se supostos repasses a terceiros para promover candidatura do ex-coach nas redes sociais, o que é proibido pela legislação eleitoral, avançaram para o período oficial de campanha

O candidato do PRTB à prefeitura de São Paulo, Pablo Marçal — Foto: Maria Isabel Oliveira/O Globo

Porto Velho, Rondônia - Após suspender perfis do empresário Pablo Marçal (PRTB) em redes sociais, a Justiça Eleitoral investiga se supostos pagamentos a terceiros para promover nas redes sociais sua candidatura à prefeitura de São Paulo — o que é proibido pela legislação eleitoral — avançaram para o período oficial de campanha. 

Em vídeo publicado no último dia 14, antevéspera da data em que candidatos passaram a poder pedir voto, uma apoiadora de Marçal, usando um boné com a letra M, fez menção a pagamentos do empresário por vídeos que o beneficiavam. Há indícios também de remuneração a conteúdo com ataques a adversários publicado na semana passada.

O vídeo da apoiadora foi citado em ação apresentada pelo PSB, após reportagem do GLOBO, ao Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo (TRE-SP), como indício de que Marçal promoveu remuneração irregular de conteúdo “mesmo após o início do processo eleitoral”. A publicação ocorreu uma semana após o primeiro debate. A apoiadora que aparece nas imagens, e se identifica como Bruna, segue engajada na campanha do empresário.

A legislação proíbe que candidatos promovam, mediante pagamento, conteúdo relativo às eleições em perfis que não sejam os seus próprios. A proibição cobre tanto o período oficial de campanha, iniciado no último dia 16, quanto a pré-campanha, usualmente considerada a partir do início do ano eleitoral.

O vídeo em questão foi publicado no perfil “Billion Marçal”, mantido até semana passada por Bruna no Instagram. O boné que ela exibe é similar ao que Marçal usou dias antes no primeiro debate entre candidatos à prefeitura. Na gravação, Bruna estimula os seguidores a adotarem sua “estratégia” para receber pela produção de vídeos curtos, os chamados “cortes”, contendo falas do candidato do PRTB.

“Então você vai utilizar essa estratégia para viralizar e para fazer dinheiro com os vídeos do Pablo, já que o corte é uma profissão. O Pablo tem um campeonato de corte, só que ele paga só até o trigésimo lugar e o nosso objetivo aqui é fazer dinheiro todos os dias com os vídeos dele, que é o que eu faço. (...) São mais de 20 estratégias, além da competição do Pablo Marçal, que ele paga em dinheiro”, diz a apoiadora.

Trecho da ação do PSB à Justiça Eleitoral

O perfil de Bruna, que tinha mais de 250 mil seguidores, entre eles Marçal, ficou inativo no último fim de semana. A movimentação ocorreu depois de o juiz Antonio Maria Patiño Zorz, da 1ª Zona Eleitoral de São Paulo, acolher um pedido do PSB para suspender os perfis oficiais de Marçal.

O magistrado entendeu que o empresário vem se beneficiando de uma “arquitetura aprofundada e consistente na capilaridade e alcance de sua imagem”, e que infringe o “equilíbrio que se preza na disputa eleitoral”. Na ação, o PSB, partido da candidata à prefeitura Tabata Amaral, argumenta que o vídeo de Bruna deixa claro que a “a estratégia visa (e sempre visou) impactar as eleições”.

“O estímulo ao corte de conteúdos de Pablo Marçal remunerados continuou mesmo após o início do processo eleitoral”, diz a petição do PSB.

O juiz pediu que o partido forneça “dados qualificativos” de Bruna, para permitir que ela seja citada formalmente e ouvida na investigação. O GLOBO não conseguiu contato com Bruna, mas identificou que ela segue engajada na campanha de Marçal. No domingo, após a suspensão dos perfis do candidato do PRTB, a conta “marcalbillion07” no TikTok veiculou um novo vídeo de Bruna, usando novamente o boné com a letra M, no qual ela se refere à decisão judicial como “crueldade” e pede voto para Marçal.

“Então, vamos juntos. Faz o M, prefeito de São Paulo é o Pablo Marçal”, diz a apoiadora.

Candidato nega

Procurado via assessoria de imprensa, Marçal não respondeu. Ele vem alegando que interrompeu os pagamentos a terceiros pela produção de “cortes” desde que começou o período eleitoral — ele já disse anteriormente que sua “equipe” comandava essas “parcerias”. Questionado na segunda-feira em sabatina da CNN, sobre o relato de Bruna, Marçal tentou se desvencilhar da atividade de seus seguidores e disse que as próprias plataformas remuneram perfis que postam conteúdos virais, com um alto número de visualizações.

— A pessoa que você mencionou é uma jovem, das várias pessoas que aprenderam a fazer isso. Não sou eu que pago; o TikTok paga por visualização, o Youtube também. Essa pessoa tem um curso que ela vende. Não fui eu que coloquei dinheiro nisso — alegou.

O próprio Marçal, porém, já divulgou ao longo deste ano, em entrevistas e publicações em redes, a realização de “campeonatos” nos quais remunera seguidores que fizerem vídeos com mais visualizações com sua imagem. Especialista em Direito Eleitoral, Fernando Neisser afirma que, a depender da comprovação do volume dos pagamentos e do alcance obtido pelos vídeos, a conduta pode configurar abuso de poder econômico e ensejar punições mais duras, que incluem até cassação da candidatura.

— A regra proíbe já na pré-campanha o pagamento para postagens em páginas de terceiros e que os custos sejam bancados por empresas. A partir do início da campanha, aumenta a gravidade se os pagamentos forem feitos fora da prestação de contas, o que configuraria caixa dois.

Na plataforma Discord, funcionários do empresário que remuneram a produção de vídeos, em um canal denominado “Cortes do Marçal”, vêm argumentando que os “campeonatos” em andamento não teriam relação com o candidato, e sim com aliados dele.

Reportagem do portal “Intercept”, porém, mostrou que ao menos um dos cortes premiados no campeonato mais recente, envolvendo vídeos do empresário Marcos Paulo, sócio de Marçal, traz propaganda negativa contra Guilherme Boulos (PSOL), o que também é proibido. Segundo a reportagem, o corte em questão foi premiado no dia 18, dois dias após o início da campanha.

O corte foi inspirado em um vídeo publicado na véspera, dia 17, no perfil de Marcos Paulo. No trecho, ele associa Boulos a comentários depreciativos sobre Silvio Santos.


Fonte: O GLOBO