
Porto Velho, Rondônia - Ao lado do consumo das famílias, os investimentos puxaram o crescimento da economia no primeiro trimestre, com salto de 4,1% sobre os três últimos meses de 2023, após a queda de 3% do ano passado. Dados da produção industrial, da importação de bens de capital e da confiança da indústria sugerem uma continuidade nesse avanço em abril.
Só a alta do primeiro trimestre já poderia garantir um crescimento nos investimentos de 3,5% sobre 2023, enquanto algumas projeções apontam para um salto de 4%, mas economistas vêm alertando para obstáculos no horizonte, como juros mais elevados.
O Indicador de Intenção de Investimentos, calculado pelo Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV Ibre) a partir da Sondagem da Indústria, mostra que a proporção de entrevistados que relatam diminuição nos aportes ficou em 10,2% no segundo trimestre, ante 10,1% no primeiro — abaixo dos 16% do segundo trimestre de 2023.
Planos saem da gaveta
A produção de bens de capital (máquinas, equipamentos, caminhões e ônibus) saltou 25,5% em abril sobre um ano antes, informou o IBGE na quarta-feira. Em volume, a importação de maquinário disparou 32,2% sobre abril de 2023, nas contas de Leonardo Carvalho, pesquisador do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), com dados da Secretaria de Comércio Exterior (Secex), do Ministério do Desenvolvimento (Mdic).
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Na construção civil — cerca de 45% do total dos investimentos no PIB, conforme o IBGE —, a produção de insumos industriais saltou 11,3% sobre abril de 2023, enquanto o total de trabalhadores ocupados no setor cresceu 4,1%, com 295 mil empregos a mais, também de acordo com o órgão federal de estatísticas.
Segundo economistas ouvidos pelo GLOBO, após o desempenho ruim ao longo de 2023, a retomada dos investimentos, que começou no fim do ano passado, se intensificou nos últimos meses porque as condições de juros e câmbio melhoraram.
Como boa parte dos aportes é financiada e depende de importações, em dólar, empresas que haviam adiado a troca de maquinário, por exemplo, aproveitaram a melhora para tirar os planos da gaveta.
Ao mesmo tempo, a demanda, seja via consumo das famílias ou via exportações, tem se sustentado. Isso justifica ampliações na capacidade produtiva, ainda que pequenas.
— O aquecimento do mercado interno neste início de ano pode ser creditado à redução inicial dos juros, porém, o patamar das taxas ainda é alto. Se mantivermos uma perspectiva de baixa da taxa de juros, facilitando o crédito, aliada a uma inflação sob controle, certamente teremos impactos positivos no consumo, e por consequência, no mercado automotivo — disse, em resposta por escrito ao GLOBO, o presidente para a América do Sul da fabricante de veículos Stellantis, Emanuele Cappellano.
A demanda aquecida sustenta planos de investimentos de grandes companhias, também por causa de tendências inerentes aos setores. Na indústria automotiva, a corrida pela eletrificação já levou ao anúncio de R$ 117 bilhões em investimentos nos próximos anos no país, pelas principais fabricantes do mundo — a Stellantis (dona de Fiat, Jeep e Peugeot, entre outras) confirmou, na semana passada, que, do plano de R$ 32 bilhões (de 2025 a 2030) já anunciado para toda a América do Sul, R$ 3 bilhões irão para a fábrica da Peugeot e da Citröen em Porto Real, no Sul Fluminense.
Além da indústria automotiva, no setor de papel e celulose, a Suzano está prestes a inaugurar nova fábrica em Mato Grosso do Sul, com aporte final de R$ 4,6 bilhões este ano, de um total de R$ 22,2 bilhões. Na aviação, a retomada global de voos aquece a demanda por manutenção, o que ajudou na decisão da GE Aerospace, divisão de turbinas da gigante americana, de investir R$ 430 milhões para expandir sua oficina em Três Rios, na Região Serrana.
Na infraestrutura, concessões firmadas nos últimos anos seguem com seus planos, independentemente do cenário econômico — a CCR RioSP, que opera a Via Dutra, começou a construir a nova subida da Serra das Araras, aporte de R$ 1,5 bilhão, até 2028.
Mudança de cenário
Os obstáculos apontados por economistas para o restante deste ano têm a ver com mudanças nos fatores que ajudaram no primeiro trimestre: juros mais elevados do que o esperado inicialmente, com o Banco Central (BC) cortando menos a Selic (taxa básica, hoje em 10,5% ao ano) e dólar mais alto.
A dinâmica mudou tanto por uma alteração nos próximos passos do Fed (Federal Reserve, o banco central americano), que vem indicando que adiará a queda nos juros por lá, quanto por novos sinais de desequilíbrio nas contas do governo brasileiro.
Conforme Cláudio Frischtak, presidente da Inter.B Consultoria, no primeiro trimestre, a taxa de câmbio se manteve mais estável, em torno de R$ 5. Nas últimas semanas, não só o dólar testou o nível de R$ 5,30 como está mais volátil, num vaivém das cotações. Segundo o especialista, “o dano maior é a volatilidade”, que dificulta a decisão, por exemplo, de importar uma máquina.
Para Rodolpho Tobler, do FGV Ibre, isso já parece na percepção das empresas, com um aumento na proporção de firmas que relatam a intenção de só manter os aportes:
— Há uma incerteza sobre até quando os juros vão cair.
As enchentes históricas que paralisaram a economia do Rio Grande do Sul podem atrapalhar num primeiro momento, mas a reconstrução do estado poderá impulsionar os investimentos mais para o fim do ano.
Apesar dos obstáculos, Carvalho, do Ipea, lembra que um dos fatores favoráveis, a demanda via consumo das famílias, deverá permanecer no médio prazo, especialmente por causa do mercado de trabalho aquecido:
— O saldo líquido, no momento, ainda é positivo.
Fonte: O GLOBO
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