Para Carlos Kawall, divisão na decisão do Copom antecipa mudança no comando do BC em mais de seis meses

Porto Velho, Rondônia - O racha na decisão do Comitê de Política Monetária (Copom) antecipou a mudança de comando no Banco Central em mais de seis meses, avaliou o ex-secretário do Tesouro Nacional, Carlos Kawall, hoje sócio-fundador da Oriz Partners. Segundo Kawall, não estava no radar uma divisão tão clara entre os diretores que foram indicados pelo governo atual e aqueles que já estavam na alta cúpula do órgão na gestão de Jair Bolsonaro.

Depois de seis quedas consecutivas de 0,50 ponto porcentual, o Copom decidiu nesta quarta-feira pisar no freio e cortar a Selic em 0,25 ponto porcentual, de 10,75% para 10,50%. Mas a decisão foi apertada, por 5 votos a 4.

Os quatro “emissários de Lula” no Copom votaram por uma redução mais forte: Gabriel Galípolo, o mais cotado para assumir o BC no ano que vem, Paulo Picchetti, Ailton Aquino e Rodrigo Teixeira.

Os outros diretores, incluindo o atual presidente do BC, Roberto Campos Neto, alvo frequente das críticas do Palácio do Planalto, votaram por 0,25pp. Campos Neto tem voto de minerva.

O mandato do atual presidente termina em 31 de dezembro. Na mesma data, também irão deixar o BC os diretores Carolina Barros e Otávio Damaso. Dessa forma, sete dos nove membros do Copom serão do “time de Lula” em 2025.

---A transição começou desde a indicação dos primeiros diretores pelo Lula, mas, do ponto de vista de mudança de perfil da decisão (de juros), dá para dizer que começou hoje (ontem).

O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, e o diretor de Política Monetária, Gabriel Galípolo em protesto de servidores do BC — Foto: Cristiano Mariz/Agência O Globo

Divergência na 'dose do remédio'

Para Kawall, além do racha, chama atenção no comunicado do Copom que não há explicações para o dissenso na votação e que a divergência não parece estar no diagnóstico, mas na “dose do remédio”.

Isso porque o documento mantém o compromisso com a convergência da inflação para a meta de 3%, destaca riscos fiscais e externos e diz que a Selic ainda deve ficar em terreno contracionista, que segura a inflação.

Em declarações recentes, Campos Neto afirmou que, no comunicado, só são expostos elementos em que há consenso no Copom e as divergências ficam para ata, um documento mais longo, que será divulgado na próxima terça-feira.

--- O fato de não ter havido esclarecimento sobre o motivo da divergência vai reforçar a ideia de um BC mais ‘suave’ a partir do ano que vem, o que já era uma preocupação latente e, a partir dessa decisão, vai se intensificar.

Em termos práticos, Kawall acredita que as expectativas de inflação devem subir mais, uma vez que um dos motivos por trás da distância entre elas e a meta de inflação de 3% é justamente um receio sobre o compromisso do BC em fazer o que for preciso para controlar a inflação à medida em que novos diretores entrem na instituição.

Atualmente, para 2025, ano em que o BC está focado, a expectativa de inflação conforme o Boletim Focus está em 3,64%. Diante desse cenário, o economista também acredita que a moeda brasileira, o real, tende a se enfraquecer, pelo menos até que se tenha mais informações sobre os motivos que levaram à divergência.

Quem são os diretores do Copom e como votaram

Roberto Campos Neto - presidente do BC com mandato até dezembro de 2024

Presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto — Foto: Lula Marques/ Agência Brasil

O atual presidente do Banco Central, Roberto Campos neto, de 54 anos, fez graduação e mestrado nos Estados Unidos. Ele assumiu o comando do BC em 15 de novembro de 2018 e deve permanecer no cargo até dezembro de 2024.

Economista e com especialização em finanças tem a maior parte de sua carreira profissional atrelada à bancos. Campos Neto iniciou sua carreira no Brasil no Banco Bozano, que seria comprado na virada do milênio pelo Banco Santander, onde atuou por 18 anos.

Votou pelo corte de 0,25 ponto percentual.

Gabriel Muricca Galípolo - Diretor de Política Monetária com mandato até até março de 2027

Gabriel Galípolo, diretor de Política Monetária do BC — Foto: Pedro França/Agência Senado

Galípolo tem 39 anos, formado em Ciências Econômicas e mestre em Economia Política. Atuou de 2017 a 2021 como presidente do Banco Fator e, desde de 2009, é sócio na própria empresa, Galípolo Consultoria, responsável por estudos de viabilidade econômico-financeira de projetos de concessões e parcerias público-privadas (PPPs).

O Diretor de Política Monetária é um cargo fundamental dentro do BC na definição dos juros, na interlocução com o mercado financeiro e também para a política cambial. Ele foi escolhido pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva e assumiu em 12 de julho de 2023.

Votou pelo corte de 0,5 ponto percentual.

Ailton Aquino dos Santos - Diretor de Fiscalização com mandato até março de 2027

Ailton Aquino dos Santos, diretor de Fiscalização do BC — Foto: Pedro França/Agência Senado

Ailton Aquino dos Santos é a primeira pessoa negra a ocupar um cargo na cúpula do BC. Atualmente ele é Auditor Chefe no Banco Central e tem mais 25 anos de casa. Também já ocupou o cargo de chefe do Departamento de Contabilidade, Orçamento e Execução Financeira do BC.

Ele possui pós-graduação em Ciências Contábeis pela Universidade do Estado da Bahia (1997), além de mais três especializações: Contabilidade Internacional, Engenharia Econômica de Negócios e Direito Público.

A diretoria de Fiscalização é o principal braço do BC na supervisão e monitoramento das instituições financeiras em áreas como modelo de negócios, liquidez e solvência. Ele foi escolhido pelo presidente Lula e assumiu em julho de 2023.

Votou pelo corte de 0,5 ponto percentual.

Carolina Barros, diretora de Administração com mandato até dezembro de 2024

Carolina Barros, diretora de Administração do BC — Foto: Raphael Ribeiro/Banco Central

Carolina Barros é servidora de carreira da instituição e já exerceu as funções de Secretária-Executiva do Banco Central e Chefe de Gabinete da Diretoria de Administração. Desde 2012 é Chefe do Departamento de Comunicação.

Terceira mulher a ocupar a diretoria do BC em mais de 50 anos, ela assumiu em abril de 2018 indicada pelo então presidente do BC , Ilán Goldfajn, na gestão de Jair Bolsonaro, e deve permanecer no cargo até o fim de 2024 quando expira seu mandato.

Votou pelo corte de 0,25 ponto percentual

Diogo Abry Guillen, diretor de Política Econômica com mandato até dezembro de 2025

Diogo Abry Guillen, diretor de Política Econômica do BC — Foto: Raphael Ribeiro/Banco Central

Diogo Abry Guillen tem 40 anos e é formado em economia pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ), onde também concluiu o mestrado. Ele tem doutorado pela Universidade de Princeton, nos Estados Unidos. Ele foi indicado pelo então presidente Jair Bolsonaro em 2021 para substituir Fabio Kanczuk.

Votou por corte de 0,25 ponto percentual

Renato Dias de Brito Gomes, diretor de Organização do Sistema Financeiro e de Resolução com mandato até dezembro de 2025

Renato Dias de Brito Gomes, diretor de Organização do Sistema Financeiro e de Resolução — Foto: Alessandro Dantas/PT no Senado

Renato Dias de Brito Gomes, à frente da diretoria de Organização do Sistema Financeiro e de Resolução, tem 41 anos e é professor da Escola de Economia de Toulouse e pesquisador do Centre National de la Recherche Scientifique. O economista é bacharel e mestre pelo Departamento de Economia da PUC-Rio e PhD em economia pela Northwestern University.

Suas principais áreas de pesquisa são economia do setor público e economia industrial, com ênfase em regulação dos meios de pagamento, antitruste e defesa da concorrência. Assumiu o mandato em em 25 de abril de 2022 escolhido por Bolonaro. Seu mandato vai até 2025.

Votou por 0,25 ponto percentual

Otávio Damaso, diretor de Regulação com mandato até dezembro de 2024

Otávio Damasco, diretor de Regulação do Banco Central — Foto: Raphael Ribeiro/Banco Central

Otávio Damaso é economista formado pela Universidade de Brasília (UnB), com especialização em Matemática para Economia e Administração pela mesma instituição. Funcionário de carreira do Banco Central há 17 anos, exerce desde 2011 o cargo de chefe de gabinete do presidente da instituição.

Assumiu em 20 de abril de 2021, no governo de Bolsonaro.

Votou pelo corte de 0,25 ponto percentual

Paulo Pichetti, diretor de Assuntos Internacionais e de Gestão de Riscos Corporativos, com mandato até dezembro de 2027

Paulo Picchetti, diretor de Assuntos Internacionais e de Gestão de Riscos Corporativos do BC — Foto: Agência Senado

Picchetti é mestre em Economia pela Universidade de São Paulo e doutor em Economia pela Universidade de Illinois. Atualmente, trabalha como professor na Escola de Economia de São Paulo, da Fundação Getulio Vargas (FGV/EESP).

Picchetti coordena o Índice de Preços ao Consumidor – Semanal (IPC-S) na FGV e acompanha a inflação há bastante tempo. Também foi coordenador de índice de preços na Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe). assumiu em janeiro deste ano, escolhido pelo presidente Lula, substituindo Fernanda Guardado.

Votou pelo corte de 0,5 ponto percentual.

Rodrigo Alves Teixeira, diretor de Relacionamento, Cidadania e Supervisão de Conduta

Rodrigo Alves Teixeira, diretor de Relacionamento, Cidadania e Supervisão de Conduta do BC — Foto: Agência Senado

Teixeira é servidor de carreira do BC com mais de 20 anos de casa. Ele tem graduação, mestrado e doutorado em economia pela Universidade de São Paulo (USP). Desde de janeiro, atua como secretário especial adjunto de Análise Governamental na Casa Civil;

Ele também trabalhou como vice-secretário municipal e chefe de gabinete da Secretaria Municipal de Planejamento, Orçamento e Gestão da Prefeitura de São Paulo, entre 2013 e 2015, período em que o ministro Fernando Haddad estava à frente da Prefeitura. Ele substituiu Maurício Moura.

Votou pelo corte de 0,5 ponto percentual.


Fonte: O GLOBO