Kremlin busca fortalecer as fileiras militares para lutar na Ucrânia, além de evitar uma mobilização impopular dos cidadãos do país

O presidente Vladimir Putin, da Rússia, aprovou uma medida que torna mais fácil para estrangeiros adquirirem cidadania russa caso o interessado se aliste no Exército em meio à guerra na Ucrânia. A medida é parte de um esforço para aumentar as fileiras militares e, ao mesmo tempo, poupar os russos de serem enviados para a batalha.

Sob o decreto, publicado pelo Kremlin nesta quinta-feira, estrangeiros que assinarem um contrato de um ano com o Exército da Rússia ou se voluntariarem para “formações militares” durante o que Moscou chama de sua “operação militar especial” na Ucrânia podem solicitar cidadania russa por meio de um procedimento acelerado. Os benefícios também se estendem aos cônjuges, filhos e pais dos recrutas.

Ao contrário daqueles que passam pelo processo regular de cidadania russa, esses estrangeiros não precisariam viver no país por cinco anos consecutivos com um visto de residência antes de solicitar. Também seriam dispensados de requisitos como falar russo, conhecer a história do país e saber as leis básicas. De acordo com o decreto, uma decisão sobre a solicitação levará apenas um mês, em vez dos habituais três.

Putin já usou incentivos semelhantes duas vezes durante a guerra na Ucrânia. O Kremlin primeiro acelerou o processo de cidadania para estrangeiros que se juntaram à luta em setembro de 2022, quando as forças russas sofriam derrotas dolorosas na região de Kharkiv. Putin então simplificou ainda mais o processo em maio do ano passado, removendo a exigência de que estrangeiros participassem de combate armado por pelo menos seis meses antes de buscar a cidadania.

Desde que o líder russo ordenou um recrutamento de até 300 mil reservistas em setembro de 2022 — uma medida impopular e que gerou a primeira mobilização geral do país desde a Segunda Guerra Mundial —, especula-se que o Exército precisaria de outra seleção para repor suas fileiras. Mas o Kremlin tem insistido que os voluntários são abundantes, e que não há necessidade de um recrutamento geral.

No mês passado, Putin disse que 486 mil novos recrutas se juntaram ao Exército em 2023, e que 1,5 mil por dia estavam assinando contratos. Ele também ordenou uma expansão das fileiras do Exército, saindo de 170 mil para 1,32 milhão. Este foi o segundo aumento desde a invasão da Ucrânia pela Rússia, em fevereiro de 2022.

Nova mobilização

Uma nova rodada de mobilização seria altamente impopular entre o público russo, sugeriram pesquisas, então Putin tem se esforçado para evitá-la. Cidades russas têm sido inundadas com cartazes que prometem altos pagamentos e status elevados para os recrutas. E nas prisões do país, os detentos — incluindo aqueles condenados por assassinato — têm recebido perdão em troca de lutar na Ucrânia.

No ano passado, mais de três milhões de trabalhadores migrantes partiram de nações centro-asiáticas mais pobres, como Quirguistão, Tajiquistão e Uzbequistão, em direção à Rússia. Eles costumam trabalhar em serviços básicos de construção, e muitos buscam a cidadania russa.

Nos últimos meses, as forças policiais têm perseguido estrangeiros que possuem passaportes russos no país, localizando-os em mesquitas e em depósitos onde muitos deles trabalham. Mais de 3 mil migrantes foram detidos em São Petersburgo na véspera de Ano Novo, de acordo com a Novaya Gazeta, um jornal russo. E alguns migrantes relataram ser forçados a assinar contratos com o Exército.

Além de considerar os migrantes como potenciais recrutas para a guerra, a Rússia também conta com eles devido à escassez aguda de mão de obra em sua economia, com sua população envelhecendo e muitas fábricas buscando acelerar a produção de armamentos.

Nesta quinta-feira, além de assinar o decreto direcionado aos recrutas do Exército, Putin aprovou um processo acelerado de cidadania russa para cidadãos da Ucrânia que viviam na Crimeia antes da anexação ilegal da península pela Rússia em 2014. Esse decreto também se aplica a cidadãos do Afeganistão, Iraque, Síria e Iêmen que nasceram em território soviético e tinham cidadania soviética.


Fonte: O GLOBO