Cantora pernambucana de 78 anos fará série de apresentações combinadas com uma exposição no Itaú Cultural

Porto Velho, RO - É pelo som das ondas rompendo em alto mar que os visitantes são guiados nos arredores espaço de exposição — com cerca de 100 metros quadrados — dedicado à cantora, compositora e dançarina Lia de Itamaracá, alvo de uma série de atrações no Itaú Cultural, localizado na Avenida Paulista, a partir desta quarta-feira.

Em uma estrutura circular – cuja intenção é remeter à ciranda, manifestação cultural da qual Lia é a maior representante, considerada patrimônio vivo de seu estado — são apresentadas fotos de sua infância na mesma cidade de Itamaracá, recortes de jornal de quando despontou na cena musical, nos anos 1970 e vídeos diversos nos quais há entrevistas, cenas de cirandas e imagens de sua cidade natal, uma ilha na região metropolitana de Recife, com 27 mil habitantes.

— Queremos que as pessoas tenham uma ideia de como é Itamaracá. Temos, por exemplo, imagens que remetem ao tempo em que Lia era merendeira e cozinhava para os alunos da cidade. É algo que ela tem muito orgulho e fazia enquanto saia para fazer shows — diz Andréia Schinasi, coordenadora do Núcleo de Música e também uma das curadoras da atividade, chamada de “ocupação”.

Entre as áreas mais interessantes da mostra, há, por exemplo, uma coleção de instrumentos que costumeiramente integram uma banda musical dedicada à ciranda. Tecnológicos, os objetos –- a exemplo de baquetas e de um chocalho — não emitem som à primeira vista. Porém, quando plugados a um fone de ouvido, disparam um programa de computador, sensível ao movimento, que dá ‘play’ na melodia.

— Ela pensa muito na moda, trabalha com cinema (esteve no filme Bacurau), extrapola apenas a música. Há, é claro, uma transformação que ela faz na ciranda, a enxerga como espetáculo — diz Andréia.

Na ala da moda, há figurinos que a artista já utilizou em shows. Ali, há uma bela seleção de vestidos com variada paleta de cores e modelagens. Outro ponto é a referência ao mar, paixão irrestrita da artista que já, inclusive, inspirou indumentárias de show na rainha dos mares, Iemanjá.

Até a tarde da última segunda-feira, 18, Lia ainda não tinha visto a mostra. Deve fazê-lo na tarde da terça, um dia antes da abertura do espaço ao público. Diz ter ansiedade mesmo que seja para dar uma "espiadinha" no espaço. A partir do dia 21, será iniciada uma série de oito shows, com entrada gratuita. Na sexta, 22, haverá transmissão ao vivo, na página do Itaú Cultural pelo YouTube.

‘Enquanto estiver viva'

Lia diz notar que houve importante melhora na abertura de oportunidade para as mulheres na arte desde seu início na música, quando tinha 18 anos. Reconhece, porém, que o governo do presidente Jair Bolsonaro trouxe uma importante desvalorização aos artistas populares.

— Falta amor, caráter. Em Itamaracá tem uma única artista que sou eu, não há gestores de cultura (locais) que apareçam para ajudar, sou eu sozinha — lamenta.

Aos 78 anos diz não ter problema em falar da idade e estar mais interessada em saber “até onde vai”, ou, o que mais pode fazer em sua vida artística — que incluí filme, um seriado ainda não lançado, e, evidentemente, a dedicação de mais de 60 anos à musica.

“Viu o tanto que a Lia já fez?”, diverte-se ao recordar das atividades. Um tema indiscutível para ela, porém, é a necessidade de que as homenagens à sua carreira sejam feitas em vida.

— Se quiserem fazer algo para mim, (homenagens) faça por mim viva. Depois que eu morrer, não adianta. Dizem ‘querem fazer uma rua com o nome de Lia, uma estátua para Lia”, façam enquanto estou viva para eu ver. Pra eu ver, aproveitar e aprovar — diverte-se.

Fonte: O Globo