Para especialistas, recomendação é adquirir divisa aos poucos para aproveitar 'preço médio'. Quem pensa no longo prazo pode investir em ativos dolarizados

Porto Velho, RO - Após subir 7,47% em 2021, o dólar comercial vem se desvalorizando em relação ao real nas primeiras semanas do ano. Até o fechamento de quarta-feira, quando a divisa registrou a cotação mais baixa em quase sete meses, a queda no ano é de 8,02%.

A melhora no mercado interno estimulou o otimismo de gestores em relação à nossa moeda. Pesquisa mensal realizada pelo Bank Of America (BofA) mostra que aumentou a proporção de profissionais que esperam que o dólar encerre 2022 na faixa entre R$ 5,11 e R$ 5,40.

Dos entrevistados, 60% esperam que o dólar seja negociado neste intervalo ao fim do ano, enquanto menos de 20% esperam que ele termine no intervalo entre R$ 5,40 e R$ 5,70.
No mês passado, o cenário era o oposto. Em janeiro, cerca de 55% dos entrevistados previam que a moeda americana chegaria ao fim do ano entre R$ 5,41 reais e R$ 5,70.

Agora, o cenário com a segunda maior adesão entre os gestores é o de que o dólar encerre 2022 entre R$ 4,81 reais e R$ 5,10. Entre os ouvidos, 20% deram essa resposta. Cenários mais extremos, como o dólar acima dos R$ 5,70, sequer foram citados.

Para a pesquisa deste mês, o BofA consultou 30 gestores profissionais, que somam quase US$ 78 bilhões sob gestão.

Comprar aos poucos

O dólar turismo, que é negociado a uma cotação maior que a do comercial, também está em baixa em 2022.

Diante disso, o consumidor pode se questionar se é um bom momento para comprar a divisa seja para adquirir um produto ou montar uma reserva para uma futura viagem ao exterior.

A recomendação dos especialistas é comprar dólar aos poucos para construir o chamado“preço médio”, especialmente, para aqueles que não precisam do dinheiro de forma imediata.

Ao comprar dólar em diferentes janelas no tempo, o comprador se aproveita de diferentes cotações e consegue se proteger das variações do câmbio, um dos indicadores econômicos mais imprevisíveis.

— Se ele (o comprador) tiver tempo, pode fazer um escalonamento. A gente fala R$ 5,18, para o comercial, mas o turismo está na faixa de R$ 5,40. Ele pode programar. Aproveita e compra uma parte agora e nos próximos meses complementa. Ele fica com um preço médio razoável. O duro é apostar toda a compra em um certo momento — diz o gerente de câmbio da Treviso Corretora, Reginaldo Galhardo.

Para quem precisa de dólares de forma rápida, Galhardo acredita que é um bom momento para a compra, mas fazendo a ressalva de que a compra planejada é sempre a melhor opção.
Volatilidade alta em ano eleitoral

A recomendação de comprar aos poucos também deve ser levada em conta pela alta volatilidade da taxa de câmbio. Apesar de boa parte dos riscos já estarem precificados nos preços dos ativos financeiros atualmente, anos eleitorais costumam gerar movimentos de altas e baixos mais acentuados.

— A taxa de câmbio é uma variável macroeconômica. Então, ela varia de acordo com movimentos da economia. Mas ela também é um ativo financeiro e, por isso, responde a movimentos de curto prazo, como a percepção de risco. Por conta dessa volatilidade e pelo fato de que é praticamente impossível prever a volatilidade de curto prazo, o que a gente indica é ir comprando aos poucos — destaca a chefe da economia da Rico, Rachel de Sá.

Viagem nas férias de julho

Para aqueles que pretendem viajar para o exterior em julho, por exemplo, diante da diminuição das restrições sanitárias, esta pode ser uma boa hora para comprar moeda estrangeira.

Como desataca Galhardo, se a compra for feita de uma só vez e muito próxima da viagem, o comprador pode ficar refém da cotação disponível naquele momento.


Está na hora de comprar dólares? Foto: Pixabay

O planejador financeiro CFP pela Planejar, Eduardo Dellavolpi Ribeiro, ressalta que a pessoa não deve se endividar para comprar dólar só pelo fato da cotação estar em queda.

No caso daqueles que têm uma viagem prevista para os próximos seis meses ou no intervalo de um ano, ele também reforça que a compra escalonada é a melhor saída.

— Você deve planejar essa viagem e estimar os gastos que terá. A partir disso, vá comprando aos poucos, porque você nunca vai acertar o momento da menor e maior cotação do dólar. Agora, se você tem uma poupança formada e quer aproveitar essa oportunidade, é um bom momento para você fazer isso — disse Ribeiro.

Dinheiro vivo lá fora

Para Ribeiro, os gastos em espécie seguem sendo os mais indicados, com o uso do cartão apenas para situações de emergência.

Vale lembrar que o janeiro, o Brasil se comprometeu com a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) a zerar, até 2029, a cobrança do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) cobrado sobre transações com o exterior.

A medida inclui, inclusive, o uso de cartões de débito e crédito no exterior por brasileiros. Hoje, a taxa é de 6,38%. Essa alíquota vai ser reduzida em um ponto percentual por ano a partir de 2023, até ser zerado em 2029.

Intercâmbio no exterior

Já para quem pensa em estudar a partir de janeiro do ano que vem, as recomendações são parecidas.

Vale destacar que este tipo de viagem tem uma duração maior e envolve mais gastos na moeda estrangeira, o que reforça a recomendação da compra com planejamento prévio.

— Quando você vai ficar mais tempo, é necessário um planejamento ainda mais apurado O mais importante é pensar no montante que você vai gastar lá. Os cuidados são os mesmos, mas os montantes envolvidos são bem maiores — destaca Ribeiro.

Por que baixou?

A melhora recente na taxa de câmbio reflete uma série de fatores. Desde o início do ano, o Brasil vem se aproveitando de uma rotação de carteira dos investidores internacionais.

Eles têm procurado papéis de “valor”, como são conhecidas as empresas com histórico mais consolidado, entre elas as de commodities e bancos, setores com forte peso no índice brasileiro.

A rotação ocorre pela perspectiva de elevação dos juros americanos, que prejudica papéis de "crescimento", como são chamadas as companhias que apostam em teses de crescimento futuro. Essas ações costumam ser as mais afetadas por um ambiente de alta nos juros.

Além disso, a alta das commodities e o diferencial de juros do Brasil em relação às economias desenvolvidas também ajudam o real. Enquanto os bancos centrais começam a dar os primeiros passos para a elevação das taxas de juros, no Brasil, a Selic já está em 10,75%.

E vale destacar que na visão dos especialistas, o dólar poderia estar ainda mais barato, não fossem os riscos fiscais internos.

Qual é a tendência?

Podem jogar contra o real, os já conhecidos riscos fiscais brasileiros, em um momento que o Congresso discute propostas de desoneração de combustíveis, que preveem redução na arrecadação. Elas desagradam o mercado e elevam a tal percepção de risco.

Um ciclo de alta nos juros mais acelerado que o previsto no exterior e conflitos geopolíticos, como as recentes tensões entre a Rússia e a Ucrânia, também podem promover uma valorização global do dólar. Em momentos de tensão, os investidores preferem se alocar em ativos mais seguros.

Investir em dólar? Ideal para longo prazo

Além da possibilidade de comprar dólares no mercado à vista, é possível investir em ativos dolarizados como uma forma de diversificar a carteira e se proteger de riscos.

Hoje, já existem vários instrumentos para se investir dessa forma, como os fundos de investimentos, ETFs, que são fundos negociados em Bolsa, e os BDRs, que são recibos de empresas estrangeiras negociadas no Brasil através da B3.

Rachel, da Rico, destaca que esse tipo de investimento deve ser feito para quem pensa no longo prazo.

— Não indicamos que você compre o dólar pensando que aquilo é um investimento A compra do dólar ou de qualquer outra moeda faz sentido se você tem um objetivo específico como uma viagem para fora do país ou se você tem uma empresa com custos em dólares — disse Rachel.

Para ela, mesmo com movimentos mais estruturais que estão ocorrendo no exterior, como a elevação dos juros americanos, a perspectiva no longo prazo segue positiva tanto para as bolsas nos EUA quanto para a renda fixa internacional.

Fonte: O Globo