Plenário do STF — Foto: Fellipe Sampaio

Porto Velho, Rondônia - O Supremo Tribunal Federal (STF) retomou, nesta quarta-feira (4), o julgamento que pode modificar profundamente a forma como plataformas digitais e redes sociais operam no Brasil. Em análise está a constitucionalidade do artigo 19 do Marco Civil da Internet, que determina que empresas só podem ser responsabilizadas judicialmente por conteúdos ofensivos ou ilegais após descumprirem ordem judicial. O julgamento é decisivo para estabelecer novos parâmetros legais entre liberdade de expressão, combate à desinformação e deveres das plataformas.

O avanço da tecnologia e das redes sociais nas últimas décadas gerou debates intensos sobre os limites da liberdade de expressão e a responsabilidade das empresas de tecnologia frente a conteúdos considerados ilícitos. Nesse contexto, o STF analisa a constitucionalidade do artigo 19 da Lei nº 12.965/2014, conhecida como Marco Civil da Internet, que estabelece regras para o uso da internet no Brasil, incluindo aspectos de privacidade, neutralidade da rede e responsabilidade civil das plataformas.

O que diz o artigo 19

De acordo com o artigo 19, provedores de aplicações de internet – como redes sociais e plataformas de vídeo – só podem ser responsabilizados civilmente por danos decorrentes de conteúdo gerado por terceiros se, após ordem judicial, não tomarem providência para removê-lo. A regra visa proteger a liberdade de expressão e evitar a censura prévia por parte das plataformas, ao mesmo tempo em que responsabiliza omissões diante de ilegalidades comprovadas judicialmente.

O julgamento no STF

Três ministros já apresentaram seus votos. O ministro Dias Toffoli considerou o artigo 19 parcialmente inconstitucional, defendendo que conteúdos ofensivos, como racismo ou apologia à violência, devem ser removidos pelas plataformas imediatamente após notificação extrajudicial, ou até mesmo sem notificação, dependendo da gravidade. Para Toffoli, o combate eficaz a discursos de ódio exige atuação proativa das empresas.

O ministro Luiz Fux acompanhou Toffoli, defendendo que a responsabilização deve ocorrer quando houver inércia das plataformas diante de denúncias de vítimas, mesmo sem decisão judicial. Fux também defendeu que os provedores devem criar canais eficientes para recebimento de queixas e remoção de conteúdo ilícito, como forma de garantir o direito à dignidade, à honra e à não discriminação.

Já o presidente do STF, Luís Roberto Barroso, adotou posição intermediária. Para ele, conteúdos relacionados a crimes contra a honra – como calúnia, difamação e injúria – devem ser removidos apenas após decisão judicial. No entanto, concorda que as plataformas devem ser responsabilizadas caso se omitam na remoção de conteúdos já declarados ilegais por órgãos judiciais.

O impacto do julgamento

O resultado desse julgamento poderá impactar diretamente as diretrizes de moderação de conteúdo das grandes empresas de tecnologia, como Meta, Google e X (antigo Twitter), e influenciar o debate global sobre liberdade de expressão e regulação digital. O julgamento também ocorre em meio a pressões internacionais por maior regulação de plataformas, especialmente no combate à desinformação, ao discurso de ódio e às fake news.

O julgamento havia sido interrompido em dezembro de 2024 após o pedido de vista do ministro André Mendonça, que agora deverá apresentar seu voto. Além dele, ainda restam os votos de outros sete ministros para a conclusão da análise.

A decisão do STF sobre a constitucionalidade do artigo 19 do Marco Civil da Internet tem potencial para redefinir os limites da liberdade de expressão na internet brasileira. Entre proteger os direitos individuais contra abusos digitais e evitar uma regulação que comprometa a livre circulação de ideias, o tribunal caminha em um terreno delicado. A expectativa é que, ao final do julgamento, sejam estabelecidos critérios mais claros e eficazes para a responsabilização de plataformas, alinhando tecnologia, direitos fundamentais e segurança jurídica.