Foto; Toda Matéria/ divulgação
Porto Velho, Rondônia - Na última quinta-feira (12), o ministro Alexandre de Moraes deu o sétimo voto favorável à responsabilização das plataformas digitais pela manutenção de conteúdos ilegais ou criminosos, mesmo que não exista uma decisão judicial prévia. Com isso, o Supremo Tribunal Federal (STF) consolidou maioria para alterar a interpretação do artigo 19 do Marco Civil da Internet (Lei nº 12.965/2014), que desde sua promulgação garantia imunidade às plataformas nesses casos, exceto quando descumprissem decisão judicial.
A discussão, que envolve os limites da liberdade de
expressão, a responsabilidade das empresas de tecnologia e a proteção de
direitos fundamentais dos usuários, deverá ser concluída no próximo dia 25 de
junho, quando o julgamento será retomado. Ainda faltam os votos dos ministros Edson
Fachin, Cármen Lúcia e Nunes Marques.
Contexto jurídico e origem do debate
O artigo 19 do Marco Civil da Internet estabelece que os
provedores de aplicações na internet — como Facebook, X (antigo Twitter),
Instagram, TikTok e YouTube — só podem ser responsabilizados civilmente
por conteúdos gerados por terceiros caso não cumpram ordem judicial
específica de remoção. A regra visa preservar a liberdade de expressão e
impedir a censura prévia, delegando ao Judiciário a função de decidir sobre
conteúdos ilícitos.
Contudo, com o aumento da disseminação de discursos de ódio,
fake news, violência digital e ataques à democracia, a constitucionalidade
desse artigo passou a ser questionada. Casos emblemáticos, como episódios
envolvendo o extinto Orkut e a desinformação eleitoral, foram levados ao STF
por meio de ações que visam discutir os limites da neutralidade das plataformas.
Votos e posições no STF
A maioria formada até agora tem votos convergentes, mas com
nuances distintas. O ministro Luiz Fux, relator do processo, propôs a adoção do
modelo conhecido como notice and takedown, utilizado em outros países.
Nesse modelo, a plataforma se torna responsável pelo conteúdo a partir do
momento em que é notificada, e não apenas após decisão judicial.
O presidente do STF, Luís Roberto Barroso, também votou a
favor da mudança, mas fez uma distinção: nos casos de crimes contra a honra,
como calúnia e difamação, seria necessário manter a exigência de decisão
judicial. Já conteúdos de grave ilegalidade, como discurso de ódio,
racismo, incitação ao crime ou pornografia infantil, devem ser removidos
imediatamente após notificação.
Com o voto de Alexandre de Moraes, que reforçou a
necessidade de maior responsabilidade das redes diante do crescimento de
discursos violentos e golpistas, o placar chegou a 7 votos a 1
Especialistas avaliam mudança como necessária, mas pedem
cautela
Em entrevista ao podcast O Assunto, do G1, a advogada
Nuria López, doutora em Teoria e Filosofia do Direito pela PUC-SP e
especialista em regulação digital, afirmou que o Marco Civil foi importante
para a estruturação da internet no Brasil, mas precisa ser atualizado diante da
realidade atual. Segundo ela, as redes sociais deixaram de ser apenas
mediadoras e passaram a influenciar ativamente o comportamento dos usuários,
tornando indispensável um novo modelo de responsabilização.
Ainda segundo López, a adoção de mecanismos de notice and
takedown pode equilibrar liberdade de expressão e proteção contra abusos,
desde que sejam estabelecidos critérios claros, procedimentos transparentes e
possibilidade de recurso por parte dos usuários.
Impactos da decisão para usuários e plataformas
Caso a decisão seja confirmada ao final do julgamento, os
efeitos serão significativos:
Plataformas poderão ser
processadas diretamente se não retirarem conteúdos ilegais após notificação
válida;
Empresas de tecnologia terão de revisar
suas políticas de moderação e atendimento às denúncias, criando canais eficazes
e céleres;
Haverá uma tendência de remoção
mais ágil de conteúdos sensíveis, como racismo, apologia ao crime, violência
política, entre outros;
Ao mesmo tempo, será necessário garantir
direitos à ampla defesa e liberdade de expressão, para que a mudança não se
torne um mecanismo de censura.
A decisão do Supremo representa um novo capítulo na
construção da regulação digital brasileira. Embora avance na proteção de
direitos e na responsabilização de grandes corporações tecnológicas, a mudança
também impõe o desafio de criar mecanismos justos e equilibrados de controle,
que evitem tanto a omissão das plataformas quanto o excesso de restrições à
livre manifestação.
O julgamento será retomado no dia 25 de junho, quando os
três ministros restantes deverão votar, e o STF poderá firmar uma tese
definitiva sobre o tema — com impacto direto sobre o presente e o futuro da
internet no país.
0 Comentários