Apoiadores da vice-presidente democrata, por outro lado, alegam que todas as chapas fizeram o mesmo nos últimos 20 anos; conversa será exibida nesta quinta-feira

A vice-presidente dos EUA e candidata democrata à Presidência em 2024, Kamala Harris, discursa no quarto e último dia da Convenção Nacional Democrata, em Chicago — Foto: SAUL LOEB / AFP

Porto Velho, Rondônia - A vice-presidente dos Estados Unidos, Kamala Harris, e seu companheiro de chapa, o governador de Minnesota, Tim Walz, darão nesta quinta-feira sua primeira grande entrevista durante a campanha presidencial. A conversa com a jornalista da CNN Dana Bash, exibida a partir das 22h desta quinta-feira (no horário de Brasília), dará a Kamala a oportunidade de rebater as críticas de que ela tem evitado dar declarações em ambientes fora de controle — e oferecerá uma chance de testar sua habilidade política antes do próximo debate com o ex-presidente Donald Trump, previsto para 10 de setembro.

Mas, se por um lado ela cumpriu a promessa de que faria uma discussão aprofundada e substancial sobre sua candidatura com a imprensa (há três semanas, ela havia prometido conceder uma entrevista “até o final do mês”), por outro, a escolha de fazer isso pela primeira vez ao lado de Walz já tem alimentado críticas de que ela tem evitado o escrutínio que vem acompanhado de uma entrevista solo. À BBC, o ex-assistente especial do presidente George W. Bush (2001-2009) avaliou ser “extremamente fraco aparecer com seu companheiro de chapa”.

Apoiadores da vice-presidente, no entanto, insistem que, dada a natureza sem precedentes de sua candidatura, iniciada após a saída repentina do presidente Joe Biden da corrida, ela está agindo com prudência. Peter Giangreco, o estrategista democrata de Chicago, disse que a sequência tem sido “correta”: “ganhe a nomeação, escolha seu companheiro de chapa, apresente seu plano econômico, faça sua convenção e agora faça algumas entrevistas”, disse. Outro potencial benefício da entrevista conjunta, continuou, é evidenciar o contraste entre Walz e o vice de Trump, J.D. Vance, a quem o governador rotulou como “estranho”.

Retórica republicana

Entrevistas conjuntas durante o ano eleitoral são prática comum. Barack Obama e Joe Biden fizeram isso ao programa 60 Minutes após Biden ser selecionado como candidato a vice-presidente em 2008. Oito anos mais tarde, Hillary Clinton e seu companheiro de chapa, Tim Kaine, fizeram o mesmo. Em 2020, Kamala e Biden escolheram o programa 20/20 da ABC. E menos de uma semana após Trump anunciar J.D. Vance como seu número dois na campanha, a dupla foi entrevistada conjuntamente na rede conservadora Fox News.

A diferença, contudo, é que esses outros candidatos também fizeram entrevistas solo. Kamala ainda não fez uma entrevista aprofundada desde que se tornou a principal representante do partido, embora tenha participado de várias conversas com a imprensa enquanto ainda era companheira de chapa de Biden. Após a saída do presidente democrata da disputa, impulsionada pela sua participação considerada desastrosa no debate contra Trump, Kamala limitou a maior parte de seu engajamento com a imprensa a ambientes roteirizados.

Isso tem alimentado a retórica republicana de que ela tem evitado qualquer oportunidade de ter seu histórico e agenda examinados de perto. No início do mês, Trump chegou a dizer que a democrata “não é inteligente o suficiente para fazer uma entrevista coletiva” e que “ela não faz entrevistas porque não consegue se sair melhor do que Biden”. No X, a conta Trump War Room escreveu esta semana, após o anúncio da CNN, que “Kamala reuniu coragem para dar uma entrevista conjunta depois de 39 dias se escondendo dos repórteres”.

“Não é coincidência que a primeira entrevista de Kamala esteja agendada para a noite de quinta-feira, antes do fim de semana do Dia do Trabalho. Eles já esperam que ela seja esquecida — e ainda nem foi ao ar. Kamala está claramente com medo de fazer uma entrevista sozinha, e é pré-gravada para que possam editar”, escreveu o Trump War Room no X.

Nesta quarta-feira, a governadora do Arkansas, Sarah Huckabee Sanders, ex-secretária de imprensa de Trump, sugeriu que Kamala precisava de uma “babá”, afirmando que é por isso que Walz estará presente. Ao programa Fox & Friends, ela disse que a campanha democrata “sabe que Kamala Harris não consegue passar por uma entrevista sozinha” e que “não há muita confiança em alguém” que quer ser presidente quando “não consegue nem mesmo sentar para uma entrevista”.

Trump, por sua vez, tem em grande parte se dirigido a meios de comunicação conservadores ao conceder entrevistas, embora tenha realizado mais entrevistas coletivas abertas nas últimas semanas, enquanto procurava recuperar os holofotes que a candidatura da vice-presidente havia tomado, publicou a Associated Press.

Energia reforçada

Kamala recebeu uma onda positiva desde que passou a encabeçar a chapa do Partido Democrata. Agora, ela lidera a maior parte das pesquisas nacionais e nos estados decisivos, e os sinais do entusiasmo por sua candidatura estão por toda parte. Para Chip Felkel, estrategista republicano e crítico de Trump, ela precisa “reforçar” essa energia, se expondo e mostrando que “consegue pensar sob pressão, porque isso é parte do que o presidente precisa fazer”, declarou ele à BBC.

O impacto real da entrevista desta quinta-feira, porém, só será conhecido após ela ter sido realizada, já que o histórico de Kamala com entrevistas de alta pressão é misto. Uma conversa em 2021 com o jornalista Lester Holt da NBC, na qual ela gaguejou ao responder perguntas sobre seu papel na política de fronteiras do governo, foi amplamente considerada um fracasso. Em uma aparição mais recente, contudo, quando defendeu a performance de Biden no debate, ela parecia calma e confiante.

— Eles só precisam ser capazes de dizer ‘Viu, nós dissemos a vocês’. E então seguir em frente — disse Felkel, o estrategista republicano.

Ao jornal americano The Hill, a campanha de Kamala Harris comentou as críticas que a democrata tem recebido. “Pelo menos nos últimos 20 anos, todas as chapas, republicana e democrata, concederam uma entrevista conjunta. A única exceção foi quando Donald Trump abandonou sua entrevista conjunta há quatro anos porque não conseguiu lidar com o fato de a jornalista responsabilizá-lo por seu histórico extremista e impopular”, escreveu a porta-voz da campanha de Kamala, Leuren Hitt, fazendo referência à entrevista do republicano em 2020 com Lesley Stahl e o vice-presidente Mike Pence.


Fonte: O GLOBO