Entre 2012 e 2022, expansão nos beneficiários foi de apenas 0,7% ao ano. Já os pagamentos avançaram 2,2% anualmente. Especialistas alertam para necessidade de nova reforma

Porto Velho, RO - Com o desafio de equilibrar as contas do regime de aposentadoria, o governo registrou um crescimento médio por ano de apenas 0,7% no número de novos contribuintes ao sistema previdenciário entre 2012 e 2022. Ao mesmo tempo, a quantidade de benefícios pagos no período aumentou em um ritmo três vezes maior, de 2,2% ao ano.

Os dados constam de um estudo do especialista Rogério Nagamine, com base na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) de 2022, feita pelo IBGE, e levam em consideração quem fez ao menos uma contribuição ao ano. Caso seja computada a média mensal de contribuintes, ou seja, os que contribuíram mais vezes, a expansão foi de 1,2% ao ano — ainda assim, abaixo da alta no estoque de benefícios pagos.

Para Nagamine, especialista em políticas públicas que foi subsecretário do Regime Geral de Previdência Social no governo passado, a baixa expansão do número de contribuintes no Brasil entre 2012 e 2022 tem relação direta com o fraco desempenho da economia no período e, consequentemente, de uma evolução pouco favorável ao mercado de trabalho.

Ele alerta, no entanto, que o problema não será resolvido se a economia voltar a crescer. Isso porque o regime de aposentadoria está estruturalmente desequilibrado devido às mudanças na demografia, com o rápido envelhecimento da população brasileira e queda na taxa de fecundidade, já que as famílias têm cada vez menos filhos.

— Os dados sobre o número de contribuintes só pioram o quadro. Como a gente vem alertando, uma nova reforma precisará ser feita para corrigir distorções — afirma Nagamine.

Carga futura para o BPC

Especialistas avaliam que o cenário também é resultado da elevada informalidade no mercado de trabalho, que aumentou com a chegada dos aplicativos de transporte e entrega no país, além do fato de a Reforma Trabalhista de 2017 ter ampliado a possibilidade de terceirizações. A partir da mudança na legislação, mais brasileiros aderiram a trabalhos autônomos ou abriram pequenos negócios, por meio de registros de MEI (microempreendedor individual). Para esses trabalhadores, a contribuição ao INSS é facultativa.

— Está havendo uma modificação na questão da contribuição, isso não é de agora. Isso já vem com a Reforma Trabalhista, com a terceirização, e a própria Reforma da Previdência também, que mudou bastante o direito dos segurados. Isso afasta as pessoas da contribuição e, consequentemente, elas estão modificando o seu mecanismo de contribuição — afirma a advogada previdenciária Adriane Bramante, presidente do Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário (IBDP).

O aumento no número de contribuintes é inferior ao crescimento do estoque de benefícios — Foto: Arte O GLOBO

Ela aponta que o fato de mais pessoas deixarem de contribuir para a Previdência pode levar a um inchaço dos mecanismos de assistência social do governo nas próximas décadas, como o Benefício de Prestação Continuada (BPC), já que essa parcela da população poderá se tornar um contingente de idosos desassistidos.

— Se você tem pessoas se afastando da Previdência Social, vai sobrar, é claro, lá na frente, para a assistência social e para o BPC — alerta Adriane.

De acordo com o levantamento de Nagamine, o país tinha 70,7 milhões de pessoas em idade economicamente ativa que não recolhiam para o regime previdenciário. O número representa menos da metade (45,5%) da população em idade economicamente ativa, estimada em 129,5 milhões. O levantamento considera uma população entre 20 e 61 anos (mulher), e 20 e 64 anos (homem).

O estudo aponta que o contingente fora do regime previdenciário é maior entre as mulheres. Os dados mostram que apenas 25,7 milhões contribuíam para a Previdência, de um universo de 64,7 milhões. As demais 39,1 milhões estavam fora da força de trabalho (21,9 milhões), desocupadas (4,6 milhões) ou na informalidade (12,5 milhões).

Em relação aos homens, 33,2 milhões eram contribuintes do regime, de um universo de 64,8 milhões. Entre os 31,6 milhões que não recolhiam para o sistema, 9,8 milhões estavam fora da força de trabalho, 3,8 milhões eram desocupados e 18 milhões, na informalidade.

Anos de estudo importam

O recorte por escolaridade revela que o número de anos de estudo tem forte impacto no universo de contribuintes. Entre as pessoas sem instrução ou com pelo menos um ano de estudo, o percentual de filiação era de apenas 13,5%. Já entre os trabalhadores com curso superior completo, o percentual saltava para 72,3%.

Segundo o autor do estudo, uma das explicações é que o nível de escolaridade é determinante na inclusão dos trabalhadores no mercado formal de trabalho. Além das tradicionais políticas públicas de combate à informalidade e o desemprego, destacou Nagamine, também são importantes medidas para aumentar as taxas de participação no mercado de trabalho, especialmente entre as mulheres.

Quando se analisa o recorte por regiões do país, com base nos registros administrativos da Previdência, observa-se uma estagnação no Sudeste, a mais desenvolvida do país. O Rio foi o único grande estado da federação que perdeu contribuintes. O total de segurados caiu de 6,260 milhões em 2012 para 5,704 milhões em 2022 — uma queda de 8,9%. Outros dois estados que registraram recuo foram Rio Grande do Sul, com 0,7%, e Pernambuco, com 0,3%.

O economista e professor do Insper André Borges afirma que o cenário aponta a necessidade de o país voltar a discutir o seu sistema de aposentadorias, cinco anos depois de ter aprovado uma ampla Reforma da Previdência.

— Era sabido que a reforma, como foi aprovada, ia ajudar mas não seria suficiente. Em algum momento, não tão distante, voltaremos a ter que discutir esse tema no Congresso — diz Borges.


Fonte: O GLOBO