Estudo da FGV que analisa publicações no X, no Facebook, no WhatsApp e no Telegram mostra que discurso alinhado ao do bilionário foi responsável por 63,5% das interações
O estudo analisou publicações no X, no Facebook, no WhatsApp e no Telegram, entre sábado (dia em que escalou a tensão entre o bilionário e autoridades brasileiras) e a tarde de terça-feira.
As postagens indicam que grupos de apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro se articularam para compartilhar o discurso de que há no Brasil uma “ditadura” protagonizada pelo Poder Judiciário. Nesses posts, há críticas concentradas no ministro Alexandre de Moraes e pedidos por liberdade de expressão nas plataformas digitais.
O professor Marco Aurelio Ruediger, diretor da FGV-ECM, avalia que o deslocamento da discussão para um debate sobre censura e liberdade de expressão é o que dá tração ao tema entre grupos de direita, que contam com uma rede globalizada para difundir esses posicionamentos:
— A questão de limitar a liberdade de expressão é uma pauta que une a direita internacional, e isso gera um engajamento muito grande. Esse exercício do Musk de intervir, de certa forma, no poder soberano de outro país é parte de uma estratégia que pode estar sendo testada no Brasil para depois se deslocar para outros cantos. É uma estratégia globalmente conectada.
O principal resultado do burburinho decorrente da altercação entre Musk e Moraes, avalia Ruediger, é a decisão do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), de criar um grupo de trabalho para analisar a regulamentação das plataformas. A revisão do chamado PL das Redes Sociais, diz o professor, favorece quadros da direita que estavam insatisfeitos com o texto anterior relatado pelo deputado Orlando Silva (PCdoB-SP).
Além de perfis comuns que opinam sobre o tema nas redes, o debate inclui também páginas de comunicação, influenciadores e figuras públicas. No Facebook, entre os dez parlamentares com maior engajamento, nove são da oposição. Destacam-se no grupo os deputados Bia Kicis (PL-DF), Eduardo Bolsonaro (PL-SP) e Gustavo Gayer (PL-GO), que disseminam uma perspectiva centrada em termos como “liberdade de expressão” e “censura”.
— Trata-se do paradoxo da tolerância — diz o professor, citando conceito disseminado pelo filósofo da ciência Karl Popper. — Defende-se a liberdade de expressão para com ela promover críticas ao processo democrático, e com isso destruir a democracia e a própria liberdade de expressão.
No WhatsApp, as 20 mensagens com maior número de encaminhamentos desde o dia 6 têm relação com o caso Musk x Moraes. De novo, a direita é quem mais domina a narrativa, com discursos favoráveis ao empresário dono do X e da Tesla, que estaria “salvando” o país de arroubos autoritários.
Menos numerosos, os perfis de esquerda que tratam do assunto defendem a regulação das plataformas digitais, a autonomia da democracia brasileira e refutam a interferência de um empresário que ameaça descumprir a legislação vigente no país.
— O erro da esquerda não é não engajar no tema, mas não deslocar essa discussão para algo que trate das instituições, tratando como um debate entre duas figuras. Seria mais interessante discutir qual a legislação que temos, o quanto o Brasil está preparado para essa dinâmica das redes, qual a capacidade estrutural para fazer um acompanhamento disso mais de perto, seguindo talvez o modelo da Europa — analisa Ruediger.
O estudo da FGV Comunicação Rio faz parte do Projeto Mídia e Democracia, realizado em parceria entre a Fundação Getulio Vargas e a União Europeia.
Fonte: O GLOBO
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